Racismo Ambiental: Se tem área de risco ocupada, é sinal de políticas públicas inexistentes...
Na semana, entre a
noite do dia 18 (sábado) e manhã do dia 19 (domingo) do mês de fevereiro,
chuvas torrenciais com aproximados 700 mm atingiram o
Litoral Norte de São Paulo, onde ocorreram deslizamentos em diversos
pontos da região, arruinando casas, destruindo
rodovias e estradas, ocasionando alagamentos, deixando 64 mortos,
dezenas de desaparecidos e centenas de pessoas desabrigadas. A maior parte
da população afetada vivia em locais de vulnerabilidade e situação risco, áreas
ocupadas em morros ou em suas encostas - o que contribuiu para a
fatalidade ocorrida e já anunciada anteriormente pelos órgãos competentes
e instituições atuantes. Ainda assim, as pessoas atingidas pela catástrofe não
são as culpadas, pelo contrário, são vítimas de uma situação estrutural,
denominado como Racismo Ambiental.
O Racismo Ambiental ocorre quando às injustiças
sociais relacionadas diretamente com o meio ambiente e num
contexto racializado — e também estrutural — do qual a
maioria das pessoas e etnias pertencentes estão inseridas em minorias étnicas,
como populações tradicionais (caiçaras, ribeirinhas), povos originários
(indígenas e quilombolas) e as populações historicamente excluídas, exploradas
e negligenciadas (negros). Dessa maneira, reproduz-se socialmente um processo de
discriminação às populações periferizadas, que sofrem com a degradação
ambiental.
Como consequência do racismo ambiental, estão as
maiores proporções de deterioração da situação do solo e de áreas verdes
remanescentes, que por sua vez, juntas à ausência de políticas públicas e
mudanças climáticas provocadas pela ganância humana, ampliam as
catástrofes que, na verdade são crimes no Brasil e, no mundo. Além
disso, essas pessoas estão sujeitas a outros problemas, como a falta de
saneamento básico, acesso à água tratada e potável, escolas
precarizadas quando existentes, sistema de saúde precário e por sua vez,
evidencia o quão desigual é a distribuição dos impactos ambientais,
explicitando que historicamente as parcelas marginalizadas e invisibilizadas
historicamente são as mais afetadas pela degradação e poluição ambiental.
Contudo, principalmente no
Litoral Norte de São Paulo, ao longo dos anos, não é o que ocorre.
Muito pelo contrário, a chegada das grandes empresas ampliam as
desigualdades e excluem as populações tradicionais caiçaras, empregando pessoas
de outras regiões e estados — ampliando a população, tendo em
vista que a maioria dessas pessoas decide por ficar nos municípios ou acabam
gerando famílias e abandonando — e promovendo a especulação
imobiliária e dessa maneira, as regiões com melhores condições de
habitação — e consequentemente com mais políticas públicas e direitos
básicos — acabam sendo
supervalorizados, obrigando às pessoas com menos poder
aquisitivo a buscarem refúgios e moradias em regiões menos favoráveis
e de extrema vulnerabilidade e perigosas. Sendo assim, diferentemente do que se
populariza, é notável que as pessoas que habitam hoje, locais em situação de
risco estão ali por necessidade, sobrevivência e consequentemente, sujeitas às
condicionantes da má gestão pública e da pressão das pessoas da
elite.
Todas as 4 cidades do Litoral Norte de
São Paulo recebem Royalties (compensações financeiras) oriundas da exploração
de petróleo e gás natural e dessa maneira, milhões de reais são inseridos nas
máquinas públicas municipais e só não podem ser utilizados para pagamentos de
funcionários e de dívidas do município, ou seja, há muito dinheiro que pode ser
utilizado para melhoria e criação de políticas públicas que visem moradias e
reduções de injustiças.
Portanto, o que faz com que as políticas públicas
não cheguem à essas regiões? Falta de dinheiro? Desconhecimento da realidade
local? Ou seria uma situação planejada pelos governantes? Por isso, é
preciso instrumentalizar a população e ela acompanhar essas verbas,
(in)formar e lutar por melhorias de condição de vida, para que as próximas
tragédias sejam evitadas e nosso povo não seja esquecido e para que a
nossa cultura não, seja ocultada.
Texto: Leonardo Gomes (Caiçara, Diretor Financeiro do Instituto Terra & Mar e Professor da ETEC de Caraguatatuba/SP)
Bibliografia Consultada:
Acesso em: 09 mar. 2023.
PIRES, Thula Rafaela de Oliveira; Guimarães, Virginia Totti. Injustiça ambiental e racismo ambiental: a marca da estratificação sócio racial nas zonas de sacrifício do Estado do Rio de Janeiro. Projeto de Pesquisa. 2014-2016.
Fotos: Jacqueline Vieira
Leonardo Gomes, parabéns pelo texto. Tomara que as vítimas desta tragédia, ocorrida no Carnaval, aquí em São Sebastião sejam tratadas dignamente!
ResponderExcluirNós também esperamos isso! Léo escreveu neste sentido mesmo de questionar e de informar. Obrigada pelo seu comentário, muito importante para a gente...
ExcluirUau!!! Texto impecável e parabéns pelo trabalho.
ResponderExcluirEsperamos que que tudo se regularize da melhor forma possível no LN.
Sim, o Léo escreve muito bem e tem conhecimento de causa. Admiro demais esse jovem e ele estará mais presente neste blog contribuindo com textos e fotos. Obrigada por seu comentário, precisamos muito de feedback. Gratidão!
ExcluirParabéns Léo pela qualidade e por descrever a realidade de nossa cidade. Isso que precisamos informar com qualidade, embasamento técnico e de vivência no território!
ResponderExcluirEsse texto me comove, porque só quem viveu isso sabe dos problemas... o prof Léo sempre sendo reizinho sensato e hablando as coisas de forma simples, tocando na ferida
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